DIOGO MAINARDI E FERREIRA GULLAR SÃOS OS “CARAS”!
O primeiro jornalista e escritor;
o segundo escritor e poeta. Dois “caras” que eu conhecia superficialmente e que
pelo que escreveram, agora tive oportunidade de conhecê-los melhor e dar o
valor que cada um merece por tudo aquilo que puseram no papel.
De Diogo Mainardi, sempre tentei
ler suas crônicas, que escrevia na revista “Veja”. Mas sempre sentia suas
críticas agudas como espinho de caatinga, que não se conforma apenas em ferir e
quando ele fere e você tenta retira-lo, ele fere e rasga a pele para aumentar o
sofrimento.
Nas ultimas semanas, li de Diogo
Mainardi o livro “A Queda” no qual o
escritor relata em linguagem crua e pungente a vida de seu primogênito Tito,
que nasceu em Veneza, Itália, com paralisia cerebral. O pai tem acompanhado -
par e passo - o desenvolvimento da vida de seu filho, vítima de lamentável erro
médico. Vale a pena ler.
Mas, nesta assentada, gostaria de
falar sobre a ultima entrevista de Ferreira Gullar que li nas páginas amarelas
da revista “Veja”, edição 2288, de 26/09/2012. Sempre vi em Ferreira Gullar um
homem feio para os padrões de beleza ocidental. Alto, magrela, rosto comprido,
enrugado. Cabelos brancos e compridos. As sobrancelhas grossas escondem olhos
pequenos e as mandíbulas salientes, o rosto encovado. Se não fosse maldade,
poderíamos comparar seu rosto enrugado, com rosto hidratado de uma múmia.
Mas, Ferreira Gullar supre a feiúra (se é que
existe), com vantagem, por notável beleza interior. Nobreza de caráter,
dignidade, lealdade, desprendimento.
Na entrevista ele se desnuda inteiramente.
Fala de ideologia política, do capitalismo desvairado do século XIX e do
fracasso do socialismo comunista. Expõe sua vida familiar com generosidade,
realçada pela inteligência, cultura e erudição.
A primeira pergunta da entrevista termina com
uma questão intrigante: ... “Como se
deu sua desilusão com a utopia
comunista”? Ferreira Gullar, responde: “Não
houve nenhum fato determinado. Nenhuma
decepção específica. Foi uma questão de reflexão, de experiência
de vida, de as coisas irem acontecendo, não só comigo, mas no contexto
internacional.”. Ele continua: ...”O
socialismo fracassou”... O fracasso do sistema foi interno “....”Não tenho dúvida
nenhuma de que o socialismo acabou, só alguns malucos insistem ao contrário”
.Em seguida, ele responde a pergunta: “Por que o capitalismo venceu?” O capitalismo do século XIX era realmente uma coisa abominável, com um nível de
exploração inaceitável”. Fala sobre a revolta das pessoas contra aquele
tipo de capitalismo. Cita o Manifesto Comunista de Marx, de l848. A luta dos
trabalhadores, o movimento sindical, a tomada de consciência dos direitos, “tudo isso fez melhorar a relação capital e
trabalho.”
. Esqueceu-se, entretanto, de mencionar
a doutrina social da Igreja Católica, as Encíclicas, principalmente a Rerum
Novarum, de Leão XIII, sobre a condição de vida dos trabalhadores e prega a
conciliação entre capital e trabalho.
Na época do Manifesto Comunista, já tínhamos
mais de mil anos de mil anos de doutrina Cristã. A influência do Cristianismo
para que o mundo descartasse a insinuante doutrina comunista e aproximasse as
relações entre patrões e empregados - não se tenha dúvida - foram decisivos para
a humanização do capitalismo. Mas, Ferreira Gullar, conclui sua resposta, de
forma magistral: “O socialismo foi um
sonho maravilhoso uma realidade inventada que tinha como objetivo criar uma
sociedade melhor”.
“O capitalismo não é uma teoria. Ele nasceu
da necessidade real da sociedade e dos instintos do ser humano. Por isso ele é
invencível. A força que torna o capitalismo invencível vem dessa origem natural
indiscutível.”
Quando responde
sobre sua vida familiar, fala da aflição que o possiu quando seu filho Paulo
desapareceu em Buenos Aires, por ocasião de seu exílio. Lembra do misto de
frustração e alegria ao reencontrar o filho numa prisão. Fala também das crises
psicóticas quando Paulo entrava em surto e tomado por alucinação, quebrava tudo
que via pela frente.
Finalmente,
responde sobre poesia e fala da necessidade de inspiração para escrever: “poesia não nasce da vontade da gente, ela
nasce do espanto, de alguma coisa da vida que eu vejo e que não sabia. Só escrevo assim. Se estou na praia, lembro
meu filho que morreu. Ele via aquele mar, aquela paisagem. Hoje estou vendo por
ele. Ai começo um poema... Os mortos vêem o mundo pelos olhos dos vivos.”
Se Barack Obama
tivesse o privilégio de ler Ferreira Gullar, penso que certamente repetiria o
que disse a Lula: “Você é o Cara”.
(perwal, 28/09/2012).